Perdão e paz
Abrir mão da vingança é um grande alívio
Quando se pensa em paz, o que nos vem à mente? Tranquilidade, harmonia, entendimento e estabilidade são para nós sensações que parecem resultar da paz. Todos esses conceitos pressupõem um estado constante de equilíbrio; o equilíbrio pressupõe negociação; a negociação pressupõe seguir em uma direção comum.
Para se ter paz é necessário viver com o mínimo de conflito. O conflito pode ser tanto interpessoal, causando problemas sociais, quanto intrapessoal, promotor de doenças mentais, desajustamentos e distúrbios.
Quanto mais conflitada a pessoa, maiores são suas dificuldades de relacionamento com os outros e mais, ela mesma se critica, rejeita ou pune. Logo, suas considerações com os outros não são muito elevadas.
É difícil interagir com alguém assim porque nunca se sabe o que esperar dela, pois nem a própria pessoa sabe o que quer. Quando o ser humano não sabe o que esperar do outro, provoca neurose em si mesmo, principalmente nas relações estáveis, íntimas e a longo prazo.
Para você viver bem no casamento, é muito importante se conhecer em todas as direções de sua personalidade e modo de ser no mundo.
Autoconhecimento básico
Perceber e analisar:
• A maneira como você lida com seus sentimentos, pensamentos, comportamentos e suas consequências, erros e acertos;
• Se você quer tudo rápido, fácil, muito e constante;
• Os elementos que povoam seus pensamentos positivos ou negativos, pessimistas ou otimistas, de esperança ou de desespero;
• Se a maneira de enfrentar os desafios, problemas e dificuldades são construtivas ou destrutivas;
• Se você enfrenta com aceitação ou rejeição o feedback, as orientações, as informações que recebe;
• Se você aceita ou nega a realidade diante de si;
• Como são suas ações, se autoritárias ou democráticas.
Os desentendimentos
Quando você se conhece um pouco mais e se respeita, as interações ficam mais fáceis de ser negociadas. É claro que dois seres tão diferentes como o homem e a mulher levam algum tempo para se harmonizarem. A situação fica ainda mais complicada se um dos dois estiver em conflito, porque seu posicionamento diante da realidade não é bem definido.
A indefinição desencadeia problemas exatamente na busca pelo bem-estar de ambos: ocasião em que se deparam com um impasse. Encontrar um ponto comum de satisfação pessoal não é fácil, pois pode haver a predominância do egocentrismo, o individualismo e o autoritarismo. Pode não haver a mínima noção do papel que se está exercendo. Daí surgem os desentendimentos.
O desentendimento pode tomar proporções intensas a ponto de causar muita dor um no outro, feridas por meio de críticas, frustrações, privações e até agressões. É o tipo de situação em que não há ganhador, não existe vencedor ou vencido. Existe sim, carrasco e vítima. O difícil é saber quem é quem.
A capacidade de tolerância do ser humano se revela na sua profundidade diante das relações íntimas da família e do casamento. É impressionante como os seres humanos se adaptam e convivem com as mais desgastantes e estressantes situações de desconforto.
Infelizmente, a capacidade de tolerância ao estresse não é igual para todos. Quando as pessoas são submetidas a um agente estressor, algumas ficam bem mais prejudicadas do que outras. No entanto, pela maneira de pensar ou de avaliar a situação é possível alterar a intensidade com que se é impactado. Ainda assim, a pessoa que estiver sob um nível de estresse superior à sua capacidade de tolerância, vai entrar em crise. Suas forças e suas técnicas empregadas para enfrentar a situação já não serão mais suficientes. Ao entrar em crise, começa-se a vivenciar uma situação traumática dominante.
Para aprender a passar pelo mínimo de desapontamentos vale a pena se conhecer para entender melhor um ao outro. Dessa forma, será possível evitar crises, ou seja, desgaste emocional, depressão, esgotamento físico e comportamentos autodestrutivos como traições, vício, etc.
Quando penso em relacionamento, logo vem à mente um conceito muito valioso: trata-se do perdão e a capacidade de que o indivíduo precisa desenvolver para entrar em contato com a dor que sente pelas feridas causadas. Em geral, a pessoa foge da dor recorrendo à raiva como substituta. Sem saber o que fazer com a raiva, apela para a retaliação, a vingança que pode tomar a forma ativa ou passiva. Só que isso também não resolve a situação; ao contrário, só agrava.
É bom não se esquecer de que em qualquer interação duradoura as pessoas envolvidas vão passar por algum tipo de contrariedade, de decepção. Por ser inevitável, a condição requisita um grau a mais de tolerância, perseverança e paciência.
Sobre o perdão
O perdão é uma necessidade porque o ser humano não é perfeito. Por isso, creio ser graças a ele que conseguimos nos adaptar ao convívio longo, satisfatório e harmônico. Acontece que nem sempre a ideia de perdão é bem-vinda porque ele pode ser interpretado como uma forma de inocentar o outro.
Porém, na verdade, o perdão é um meio para aliviar o sofredor, a “vítima”, o agredido. O agressor, o carrasco e o insensível não precisam do seu perdão. Quem fere não sente e quem não sente não sofre ou não tem noção de que esteja sofrendo. Ele pode nem ter ideia, inclusive, da razão de você estar se sentindo mal.
É bom saber que o perdão é para ajudar o ofendido a deixar de alimentar a raiva, a vingança, o medo, a culpa e a tristeza, sentimentos que, a longo prazo envenenam a pessoa que os nutre.
De forma prática: o perdão existe para proteger a vítima de, além da dor, continuar agonizando com a peçonha da vingança.
Considere a ideia de perdão, cuide-se, e viva em paz.
Cesar Vasconcellos de Souza é psiquiatra
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